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Num estudo cujos resultados apareceram publicados em vários jornais, a escola de marketing IPAM concluiu que o Mundial de Futebol do Brasil terá um impacto de 200 a 609 milhões de euros na economia portuguesa.

Esta variação depende, como é óbvio, do sucesso da seleção no torneiro.

O estudo previa que, mesmo que Portugal não se qualificasse, o impacto mínimo seria de 200 milhões.

No entanto, como todos ontem podemos assistir, a equipa de Paulo Bento, com um fabuloso Ronaldo, eliminou a Suécia, e estará no Brasil.

Assim, a primeira etapa está ultrapassada, o que significa que, no mínimo, a seleção fará 3 jogos no Brasil.

Se ficar apenas na primeira fase, o estudo do IPAM conclui que o impacto será mesmo assim de 438 milhões de euros, contando com as receitas que geram o estágio e os jogos oficiais.  

A partir daqui, o impacto vai subindo, até chegar a um valor máximo estimado em 609 milhões de euros, caso Portugal seja campeão do mundo na final.

 

Como se chega a estes valores?

Segundo foi noticiado, o IPAM usa um modelo inglês, da UKSports, uma agência governamental inglesa.

Nesses modelos, há dois tipos de impactos que se devem levar em conta.

Os primeiros são os "impactos económicos directos": receitas dos jogos, receitas da federação, receitas das empresas de televisão durante a transmissão dos jogos, aumento de consumo durante os jogos, em restaurantes, bares e supermercados; ou despesas de viagens dos portugueses que vão ao Brasil e que voam na TAP e usam agências portuguesas para lhes marcar a estadia.   

É evidente que, sendo o Mundial no Brasil, as receitas de bilheteira dos jogos não são para Portugal, mas deve-se aqui contar com um ou dois jogos particulares, ainda em Portugal, que a seleção vai certamente jogar antes de partir para o Mundial.

As receitas que a FIFA distribui, depois do Mundial, também têm de ser consideradas, pois são receitas da Federação Portuguesa de Futebol, e aumentarão se a equipa chegar longe.

Haverá direito a prémios por resultados, e uma partilha das receitas televisas da FIFA, embora em Portugal esse seja um item com menos força, pois o país não representa uma grande audiência.

Mas, se pensarmos que em 2010 os direitos televisivos foram vendidos pela FIFA por 2,6 biliões de euros, alguma coisa cá chegará em 2014.

De seguida, temos de ver qual a receita adicional directa para as televisões que vão transmitir o Mundial.

Seja nas semanas antes dos jogos, seja durante as transmissões e todo o torneio, há sempre um crescimento adicional de receitas publicitárias, e que pode ser significativo. 

A estes benefícios, há que somar ainda o aumento dos consumos do portugueses durante a transmissão dos jogos.

É sabido que muitos vão a restaurantes, cafés e bares, ver os jogos e isso aumenta a receita desses locais.

Além disso, muitos organizam jantares ou encontros em casa, recebendo amigos, que trazem sempre cerveja, comidas, etc.

Há igualmente que contar com vendas adicionais de televisões, para ver os jogos; e mesmo com aumentos de despesas em deslocações, que se não houvesse jogo não existiam.

É evidente que alguma dessa despesa adicional seria feita mesmo que a Seleção não fosse ao Brasil, mas com Portugal presente, o impacto no consumo será certamente muito maior.

Por fim, há também que contabilizar as viagens. É provável que muitos portugueses rumem ao Brasil, para assistir a alguns jogos, e o façam utilizando empresas portuguesas, como a TAP ou agências de viagens. Esta despesa adicional, que só existe por causa do Mundial, deve ser acrescentada também.

 

Além dos impactos económicos directos, há que considerar os "impactos económicos indirectos". A despesa inicial que se faz com estes eventos, irá depois circular pela economia, gerando novos consumos.

Os donos dos restaurantes e bares, com o dinheiro extra devido a terem mais clientes durante o Mundial, se calhar vão celebrar comprando alguma coisa, ou comprando uma televisão nova lá para casa.

Assim, neste tipo de estudo, é costume aplicar ao "impacto económico directo" um multiplicador, para obtermos o "impacto económico indirecto".

Na maior parte dos casos, o multiplicador costuma ser próximo de 2.

Ou seja, se o "impacto económico directo" for 200 milhões de euros, o impacto total será de 400 milhões, sendo que 200 milhões são o "impacto económico indirecto". 

Olhando para o estudo do IPAM, podemos talvez considerar que, dos 609 milhões de euros previstos se Portugal for até à final, 300 seriam de "impactos económicos directos", e 300 de "indirectos", embora eu não tenha tido acesso aos critérios do estudo, e por isso esta seja apenas uma estimativa intuitiva.

 

São estes estudos fiáveis e credíveis?

Nos últimos anos, têm sido levantadas algumas objecções a este tipo de estudos, considerando que eles normalmente exageram os benefícios económicos, pois apenas captam os efeitos de aumento de despesa bruto, e não o aumento de despesa líquido.

Porém, neste caso, é evidente que a maior parte das receitas não existiria se não houvesse Mundial, e parece também óbvio que os consumos em restaurantes e supermercados não seriam certamente tão altos.

É claro que se deve considerar só a receita extra, a diferença entre um dia normal e um dia de Mundial, mas parece-me evidente que ela é grande.

E, no caso das viagens de portugueses para o Brasil, também só se devem considerar as viagens que foram propositadamente por causa dos jogos, e não as outras, que existiram na mesma sem Mundial.

Agora, se muitos portugueses não forem na TAP, mas em empresas de aviação brasileira, essa receita já não é portuguesa, e não deve ser considerada.

 

Em resumo: embora não saiba em pormenor os números que o IPAM usou, não me parece que os resultados do estudo estejam exagerados, e é provável que o impacto do Mundial em Portugal seja um acontecimento económico relevante em 2014.

Se serão 600 milhões, mais ou menos, depende um pouco da fórmula de cálculo usada, mas é provável que o número não ande longe desse. 

publicado às 12:05


2 comentários

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De Gabriel Ramos a 22.11.2013 às 16:43

Boa tarde caro Domingos Amaral,

Sou um grande apreciador dos seus textos, sempre que tenho tempo leio alguns, porque admiro a sua escrita e os seus conhecimentos.

Disse no seu texto que o multiplicador é próximo do valor 2. Poderia dizer-me, mais ou menos, como é que se calculou esse valor? É que na minha opinião é muito difícil encontrar o valor para tal indicador, visto que depois do consumo inicial de todos os portugueses, o impacto económico indirecto não é assim tão calculável (ou é só um número atirado ao ar?)
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De Domingos Amaral a 26.11.2013 às 12:20

Caro Gabriel Ramos
Adoptei aqui aquilo que é normalmente adoptado em quase todos os estudos internacionais, um multiplicador próximo de 2. Na verdade, também tenho algumas dúvidas sobre esta convenção, e parece-me que, sobretudo em épocas de grave crise económica o multiplicador será menor, talvez 1,5 ou mesmo menos. Porém, decidi manter a convenção. Cumprimentos Domingos Amaral

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Sobre o autor

Domingos Amaral é professor de Economia dos Desportos (Sports Economics) na Universidade Católica Portuguesa. É também jornalista e escritor e tem o blog O Diário de Domingos Amaral.

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oeconomistadabola@gmail.com

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